A capitã, MVP e artilheira do Mundial, Homare Sawa, levanta a taça / Getty Images
O Japão venceu os Estados Unidos nos pênaltis e é o campeão da Copa do Mundo Feminina da Fifa. O real tamanho dessa conquista, só o tempo dirá. Mas a forma como as Nadeshiko se superaram para vencer um time que se mostrou superior na maior parte do jogo teve tantos elementos de drama, emoção e suspense que daria um filme e tanto.
A situação do futebol feminino no Japão é um pouco melhor que a do Brasil, mas as dificuldades ainda são muitas. Lá até já existem times formados e uma liga nacional (a L-League), mas apenas algumas jogadoras têm um contrato profissional - a maioria não recebe nada para jogar. Os treinamentos e jogos são durante a noite; assim, as atletas precisam ter um emprego fixo durante o dia. A entrada é franca para assistir os jogos, mas mesmo assim o público é escasso. Com a tragédia de 11 de março e o consequente racionamento de energia, a preparação da seleção para a Copa do Mundo não foi a ideal; os treinos eram limitados e foi até cogitada a possibilidade de não participar do Mundial da Alemanha.
Passando por cima de tudo isso, as garotas mostraram um futebol digno do 4º lugar que ocupavam no Ranking da Fifa e chegaram até a final de forma convincente, derrubando no meio do caminho potências mundiais como Alemanha e Suécia. Mas ainda havia um último obstáculo para conquistar a maior glória que um país pode conseguir no futebol: os Estados Unidos.
As japonesas nunca tinham derrotado as adversárias da final em toda a história. Em 25 confrontos, eram 22 vitórias dos Estados Unidos e três empates. Duas dessas partidas foram disputadas há apenas dois meses, em amistosos: as americanas venceram nas duas ocasiões por 2x0.
O time que entrou em campo foi o mesmo que venceu a Suécia por 3x1 na semifinal
Foi só a partida começar e os Estados Unidos partiram para o ataque de forma avassaladora. A goleira Ayumi Kaihori já teve que fazer uma difícil defesa com apenas 20 segundos de jogo. Era uma chance atrás da outra, e em pelo menos mais cinco oportunidades - como o chute de Abby Wambach que acertou o travessão - as americanas estiveram muito perto de fazer o primeiro gol. Incrivelmente o placar continuava 0x0.
A sueca Pia Sundhage, técnica da seleção americana, armou seu time de forma a anular a principal característica do Japão: o toque de bola. Aya Miyama sofria marcação cerrada e pouco apareceu. A incansável capitã Homare Sawa teve que se concentrar mais em ajudar a defesa e quase não subia ao ataque. Assim, o Japão teve "apenas" 53% de posse de bola, grande parte desse tempo apenas tocando a bola entre as defensoras, perdendo a bola rapidamente nas tentativas de ataque.
Para o segundo tempo, os Estados Unidos perderam uma de suas principais jogadoras, a atacante Lauren Cheney, que saiu machucada no intervalo. Mas em seu lugar entrou a veloz Alex Morgan, que acertou um chute na trave logo no início. Não demorou até que finalmente saiu o primeiro gol. Em um contra-ataque fulminante, Megan Rapinoe lançou do campo de defesa, Morgan ganhou da zagueira Saki Kumagai na velocidade e chutou cruzado, com força, no canto de Kaihori: 1x0.
As japonesas pareciam estar mais cansadas, por terem que passar tanto tempo defendendo e correndo atrás das adversárias, jogando de uma forma que não estavam acostumadas. Mas o gol de empate veio a 10 minutos do fim. As atacantes Yuki Nagasato e Karina Maruyama haviam entrado para dar uma movimentação maior no ataque e, em uma rara oportunidade, Nagasato cruzou na área para Maruyama, que dividiu com a zagueira; a bola acabou sobrando para Miyama na frente do gol, e ela não desperdiçou: 1x1 e a partida se encaminhou para a prorrogação.
No final do primeiro tempo da prorrogação, veio o balde de água fria: cruzamento pra área e Wambach marcou de cabeça: 2x1. Parecia o final perfeito para as americanas, que viram Wambach marcar também de cabeça, nos últimos minutos da prorrogação, e salvar sua seleção da derrota contra o Brasil nas quartas de final. Mas o segundo tempo reservava mais emoções.
Faltando quatro minutos pra acabar, Sawa desviou uma cobrança de escanteio e deixou tudo igual novamente. Uma reação improvável por tudo que foi a partida, mas o fato é que o placar mostrava 2x2 e a decisão por pênaltis estava próxima. As americanas queriam vencer de qualquer forma no tempo normal, e tiveram uma grande chance quando Morgan recebeu um passe tendo apenas a goleira à sua frente. Azusa Iwashimizu não pensou duas vezes e se atirou no chão, derrubando a americana por trás bem na frente da grande área. Falta muito perigosa e cartão vermelho para a japonesa. Depois da cobrança e uma bola rebatida na frente do gol, as Nadeshiko se salvaram e a decisão do título foi para as penalidades máximas.
A vantagem parecia ser mais uma vez das americanas. Afinal, elas tinham Hope Solo, a melhor goleira do mundo, enquanto Kaihori era o "ponto fraco" do Japão. A arqueira nipônica havia falhado em alguns momentos no Mundial, é verdade. Mas em tantos outros, principalmente nos jogos decisivos, ela foi segura e não cometeu erros. Kaihori não tinha sido brilhante, mas foi genial na disputa de pênaltis. Ela defendeu as cobranças de Shannon Boxx e Tobin Heath e viu Carli Lloyd chutar para fora, enquanto Wambach foi a única a converter. Já Hope Solo defendeu apenas o pênalti de Nagasato, enquanto Miyama, Sakaguchi e Kumagai marcaram.
As americanas foram as melhores durante os 120 minutos, isso é fato. As japonesas, que jogaram no limite de suas forças físicas e buscaram energias para fazer um verdadeiro milagre dentro de campo, não fizeram por merecer uma vitória no tempo regulamentar, mas lutaram bravamente a ponto de não merecerem a derrota. Qualquer que fosse o vencedor na disputa de pênaltis, a taça estaria em boas mãos.
Sawa cansou de receber troféus na cerimônia de premiação. Primeiro o prêmio Fair Play (em quatro dos seis jogos disputados, elas não receberam um único cartão amarelo), depois a Chuteira de Ouro (Sawa foi a artilheira com 5 gols), a Bola de Ouro (prêmio para a melhor jogadora) e, por fim, a taça de campeãs. Foi o dia mais importante da história do futebol feminino japonês, que evoluiu muito nos últimos anos e tem tudo para continuar assim, firmando-se agora entre as melhores seleções do mundo.
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